segunda-feira, 8 de junho de 2009

Conversas

Ontem passei umas horas bastante agradáveis na sala de espera do São Francisco Xavier.
Na sala de espera n.º1 ouvi uma senhora a explicar a outra o decorrer das buscas do voo AF447. A melhor parte foi quando a outra lhe perguntou "mas afinal o que aconteceu para o avião cair" e a senhora mais informada responde com o ar mais sério e certo deste planeta "só deus nosso senhor sabe o que aconteceu, só deus sabe...".
Depois fui chamada. Quando voltei a conversa estava muito mais interessante. A senhora mais informada lia um jornal onde dizia que um magnata qualquer era filho de um carpinteiro e de uma doméstica. A sobrinha não queria acreditar e quis ler com os seus próprios olhos. Leu e exclamou: "Então quer dizer que lá por eu ser filha de uma mulher a dias e de um desempregado ainda posso ser alguém." "Podes", diz a mais informada, "tens é que estudar muito". Ah pois é!
Voltei a ser chamada e quando voltei decidi mudar de sala de espera. Má escolha. Muito má escolha mesmo. A sala era muito pequena e as doenças pareciam que se propagavam só porque sim. Três minutos depois de eu me ter sentado lá num cantinho, chega a dona maria odete. Uma senhora pesada e com muita vontade de falar. Eu não tinha vontade nenhuma de falar. Nem vontade nenhuma de ouvir fosse o que fosse, a não ser o meu nome a ser berrado num altifalante esganiçado lá da sala.
Bem, a dona maria odete sentou-se e fez logo conversa com a senhora do lado. A senhora do lado não estava com ar de quem quisesse conversar. Mas ouviu-a. Ouviu ela e eu também. A dona maria odete tem diabetes. Há uns tempos pôs uma banda gástrica e emagreceu 50kg (mas ela ainda é enorme!!!!), mas está desolada porque há cinco meses que não come carne, peixe e fruta. Só sopa passada. Ontem foi ao hospital porque está com a pele que parece que apanhou um escaldão, mas não apanhou, até porque não vai à praia há anos. Talvez tantos como os que esteve fechada em casa - 15 anos! - por não conseguir andar por culpa do excesso de peso. Agora, "se deus quiser", faz 67 anos a 22 de Agosto.
Eu fiquei sempre de olhos postos numa revista que não me apetecia ler, só para os meus olhos não me cruzarem com os da dona maria odete. Eu sei que não é muito simpático dizer isto, mas eu queria paz e sossego e sair dali o mais depressa possível. Não queria saber de doenças de ninguém, nem de incentivos do estilo "ah quando o meu tio chegou a este hospital com uma dor de cabeça só saiu daqui para o cemitério". Não é bom ouvir isso na sala de espera de um hospital.

2 comentários:

acatar disse...

ah, finalmente o blog acordou do sono...

isto não é um comentário, hein? Pq eu disse que não comentava mais neste blog...

bjs

Filipe Pinto disse...

BRAVO... delicioso.
Este sim é o ambiente tão familiar quanto tradicional dos nossos hospitais (e que se há-de manter, se deus nosso senhor quiser)
Maravilhoso, desde as conversas às revistas amolecidas do tempo, vale tudo, interessa tudo - sabe-se tudo.
E o mais engraçado é mesmo saber o que está na origem desta visita.
Foi tão... tão... "LINDO"!

Um abraço (não muuuuito apertado)